Crianças expostas à tecnologia correm o risco de desenvolver TDAH?

Por Msc. Daniele Vido (Coordenadora da Tutores Santo André)

Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e, frequentemente, acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Este transtorno pode causar muitos prejuízos a seus portadores, manifestando-se em atividades acadêmicas, em relacionamentos e, em alguns casos, na vida profissional.

Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade. Pesquisas recentes apontam que o TDAH tem prevalência estimada em torno de 3,5 a 8% em diferentes áreas geográficas, incluindo o Brasil.

Muitos educadores, médicos e pais já consideram o TDAH como parte da realidade dos jovens nos dias de hoje, sendo frequentemente observado nos âmbitos familiar e escolar. No entanto, seu diagnóstico ainda é controverso. De acordo com Raquel de Mesquita, psicóloga com doutorado em Psicologia da Educação pela Faculdade de Educação da UFMG, até o momento, o que nem todos sabem é que não foi desenvolvido nenhum exame neurológico específico para detectar e diagnosticar com exatidão o TDAH.

Um dos principais obstáculos para o diagnóstico deste transtorno é o elevado índice de comorbidades, ou seja, transtornos associados ao TDAH que se apresentam e dificultam o estudo individual deste mal e sua etiologia.

Outro fenômeno que já faz parte do cotidiano de grande parte da população é o uso diário de smartphones, tablets e telas de maneira geral. O uso destas telas é cada vez mais proeminente no mundo atual. No Brasil, não é diferente. Segundo o portal alemão de estatística Statisa, os brasileiros gastam em média 4h48 por dia frente aos celulares, tempo superior ao gasto pelos chineses e norte-americanos que passam, respectivamente, 3h03 e 2h37 frente a esses dispositivos. Itália e Espanha completam o ranking liderado pelo Brasil. Esses dados se referem ao ano de 2016 e apresentam um grande crescimento frente às medidas realizadas em 2012. No caso do Brasil, o tempo de uso de celulares mais do que dobrou em quatro anos.

O leitor mais atento poderá se perguntar:

Qual a relação entre o TDAH e o uso das referidas telas?

Essa pergunta tem sido feita por pesquisadores e ainda é objeto de pesquisa em grandes centros ao redor do mundo.

Segundo o professor Dimitri Christakis, pediatra, pesquisador e diretor do Centro de Saúde, Desenvolvimento e Comportamento Infantil do Seattle Children’s Hospital, o TDAH aumentou em 30% nos últimos 20 anos e fatores ambientais podem, sim, explicar este aumento, ao contrário do que muitos afirmam. De acordo com o Dr. Christakis, um desses fatores pode ser a exposição excessiva à mídia audiovisual durante a primeira infância.

“Estudos observacionais em humanos ligaram a exposição à televisão em ritmo acelerado nos primeiros 3 anos de vida com déficits de atenção subsequentes na infância tardia. No entanto, embora longitudinal e bem controlada, a natureza observacional desses estudos impede conclusões definitivas sobre uma
relação causal.”, alerta o pesquisador.

Como os estudos experimentais em seres humanos muitas vezes não são nem éticos nem práticos, foram desenvolvidos modelos de estimulação sensorial excessiva (ESE) em ratos durante a infância. Tais experimentos corroboram que o ESE leva a déficits cognitivos e comportamentais, alguns dos quais podem ser potencialmente prejudiciais.

Em entrevista recentemente concedida ao programa “60 minutes” transmitido pela emissora norte-americana CBS, a Dra. Gaya Dowling, pesquisadora de um centro governamental de pesquisa voltado ao estudo sobre o abuso de drogas, revelou que estudos atuais apontam que o uso excessivo de telas por parte de crianças pode causar mudanças no córtex cerebral. Os primeiros dados analisados pelo grupo norte-americano foram obtidos por meio de imagens de ressonância magnética capturadas do cérebro de 4500 crianças entre 9 e 10 anos de idade que usam celulares, tablets e videogames por mais de 7 horas por dia.

Segundo a pesquisadora, os resultados foram intrigantes, no entanto, ainda é muito cedo para que os cientistas possam tirar conclusões. Nesse primeiro momento, realmente foram observadas mudanças e, segundo a Dra. Dowling:

“Algumas perguntas poderemos responder em alguns anos, mas algumas das questões realmente interessantes sobre esses resultados a longo prazo, teremos que esperar um pouco, porque elas precisam acontecer”.

O estudo em questão é considerado por muitos um dos mais ambiciosos no que tange o desenvolvimento cerebral de jovens e adolescentes e tem por objetivo, entre outras coisas, tentar entender como o tempo de tela (screen time, do inglês) pode afetar a estrutura física dos cérebros das crianças e como o uso destes aparelhos pode influenciar no desenvolvimento emocional, na saúde mental destas crianças e seus possíveis desdobramentos, como a contribuição para o desenvolvimento de transtornos relacionados ao déficit de atenção. Para tanto, pesquisadores desta agência irão acompanhar mais de 11000 crianças por todo o país e por mais de 10 anos. Estima-se que este projeto irá custar algo em torno de U$300 milhões.

De acordo com as pesquisas atuais, não se pode afirmar categoricamente que o uso das telas é o causador do TDAH. No entanto, as correlações existem e devem ser analisadas. Cabe a todos, na ausência de confirmações científicas, atentar para que o objeto de toda essa discussão – o bem-estar e o desenvolvimento das crianças que construirão o mundo de amanhã – seja tratado com o devido cuidado. Ou seja, não se omitam e ponderem suas atitudes frente às crianças, afinal o exemplo é um grande fator na criação dos filhos. Dê limites às crianças frente às tecnologias e estimule a coerência de seu filho desde sempre.


Mestre em Pediatria e Ciências aplicada em Pediatria pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), com dissertação premiada em 2015 pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia. Experiência de 15 anos em docência de educação básica com diversos cursos relacionados a educação. Coordenadora e gestora há 6 anos da Tutores na Unidade de Santo André, atuando com alunos com dificuldade em aprendizagem.
[email protected]
Tel. : (11) 99285-4420
@tutores.santoandrebairrojardim


Maria Cláudia Aravecchia Klein: editora da Revista Vida Prática, jornalista, casada e mãe de dois meninos. Na imprensa, trabalhou para Custom Editora, Editora Globo (Casa & Jardim), Editora Abril, Editora Escala (Casa & Decoração), Editora Segmento, entre outras. Em seu portfólio está a publicação de livros, biografias empresariais e revistas customizadas para várias empresas e editoras. Entre os clientes atendidos: Braskem, USCS, Semasa, Petrobras, Pearson Education, Just Editora, Formica e British Council. Na internet, atua desde 1997 na geração de conteúdo digital para sites, blogs, mobile e mídias sociais.

Conheça o site para mais dicas: www.revistavidapratica.com.br
E-mail: [email protected]